Se considerarmos que
todo rito corresponde, em sua raiz, a um mito e que os mitos dizem respeito a
uma forma de ver o mundo e a realidade. Certamente, em uma leitura livre de
esquemas comparativos que depreciem qualquer forma de realizar a experiência do
sagrado em diferentes ritos e culturas, apenas poderemos constatar que as
fusões e reinterpretações que são inseridas no chamado caldeamento de culturas,
como ocorrem no Brasil, que mescla diferentes cultos de origem africana,
transformando-os e preenchendo-os com diferentes significados, tal conduta,
muitas vezes esvazia o significado original o que serve tanto como perda da
tradição como elemento fragmentador dos mitos geradores dos ritos adotados.
Então, partindo desse particular ponto de
vista, a MUKANGÊ (MASCARA), que é característica da tradição congo-angola e
marca específica de sua visão da manifestação da divindade Nkisi, reflete algo
de seu mito espiritual, algo que merece ser considerado e meditado, para ser
compreendido.
Sobretudo, a singularidade da Mukangê (Mascara),
demonstra muito da visão congo-angola sobre o Nkisi, porque diferentemente da
tradição Yorubá, não se enfatiza a natureza da divindade em sua encarnação
humana, mas a natureza divina e singular do Nkisi em seu iniciado e filho, que
através do seu transe traz ao mundo da relatividade de forma única, uma energia
sagrada que jamais tomou essa forma, pois que cada filho seu reflete uma
singularidade original.
Na tradição Yorubá, a divindade certa vez, em
seus mitos de origem, tomaram a forma humana e quando se manifestam as
divindades em seus filhos, gostam de identificar-se com as mesmas coisas que
são descritas pelo seu comportamento quando estiveram aqui no mundo humano.
Já na tradição congo angola, as forças
espirituais dos Minkisi, permanece sempre no mundo abstrato do sagrado, de
forma que quando o iniciado coloca a máscara e manifesta seu “Santo”, apesar de
estar manifestando no plano humano a força de uma divindade, ele se
despersonaliza pela máscara, demonstrando que não é ele quem dança quem se movimenta
que se comunica, mas a entidade espiritual que através de sua cabeça pode vir
ao mundo da relatividade.
Assim, que se pode verificar que cada máscara
de Nkisi é diferente das demais, enquanto que o Adê (Coroa) do Orixá Ioruba enfatiza
a identificação com um comportamento arquetípico do Orixá, a Mukangê (Mascara)
enfatiza a singularidade do Nkisi que encontrou um filho seu para se manifestar
de forma completamente nova no mundo, ainda que com os princípios subjetivos de
sua força original.
Vale destacar que a comparação nem sempre é
saudável porque pode gerar juízos depreciativos, porém todas as visões são
importantes para entendermos nossas raízes religiosas. Quem sabe em breve
poderemos contar com estudos mais profundos e completos na teologia comparada
entre dos mitos de diferentes culturas áfricas...
Isto posto, pergunto aos meus severos e odiosos
críticos, o que é melhor compreensivo e adequado, paramentar o Orixá com um Adê
(Coroa) utilizando para tal os apetrechos literalmente e visceralmente já caracterizando
a tradição Yorubá-nagô, apelidando essas divindades de Nkisi ou paramentar o
Nkisi com a sua indumentária e insígnia que pode ser Mukangê (Mascara), lança
etc.?
Até quando vamos continuar alimentando mentiras
vergonhosas e apresentando desculpas deslavadas e insanáveis, orixalizando e
nagotizando os Minkisi...?
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